quinta-feira, 19 de novembro de 2009

Novamente Jenifer


Lembram da Jenifer, a menina da boneca? Pois a reencontrei hoje. Estava eu distraída, na frente de uma cafeteria do bairro onde moro, esperando por uma amiga, quando surgiu do nada um pequeno ser que acenava feliz. Era a menina dos dentes de luar. Vinha sorrindo e pulando, com a agora inseparável amiga, Titi, a boneca.
- Tia, ela tem dado um trabalho...Faiz cocô na flalda toda hora! As minhas mana fica limpano pra mim quando eu vô trabaia...Pega ela um pouquinho...
Bom, se o negócio era fantasiar, lá fui eu:
- É amiga, e no que você trabalha?
A guria perdeu o brilho que tinha nos olhos:
- Eu fico aqui, na rua, pedino dinheiro...
Instantaneamente parou de brincar, pegou a boneca de minhas mãos e com o olhar baixo foi saindo, se dirigindo a lugar nenhum. Só queria sair dali.
Fiquei novamente arrasada, como em nosso primeiro encontro. A diferença é que naquele dia tinha conseguido um sorriso e agora uma tristeza sem fim. Não sabia o que fazer, como consertar, então corri atrás, agi impulsivamente e segurei a menina pelos ombros:
- Eu vi que ficaste triste...
Jenifer chorou, chorou copiosamente. As lágrimas escorriam por seu rosto negro, deixando aqueles olhos "de bulitas" mais lindos do que já eram. Eu continuei, atônita:
- Vamos, Jenifer! Divide comigo o teu sofrimento. Porque estás assim?
A menina disse então, entre as lágrimas que teimavam em cair, que não queria ser "esmolenta" e sim doutora de crianças. Argumentei que ela iria conseguir, que estava estudando e logo conseguiria, mas ela me jogou um balde de água fria:
- Como assim? Eu vou na escola só as vez...A mãe nem me deixa eu aprendê a lê, a inscrevê...
E continuava chorando. De repente, começou a tremer. A mãe chegava ameaçadora, gritando:
- Tu tá de conversê de novo? Sai, vai logo pedir praquelas mulhé alguma coisa, vai!
E Jenifer saiu correndo, assustada. Fiquei eu, sozinha, olhando aquela cena e igualmente chorando...Agora eram minhas as lágrimas que caíam. Sentei na cafeteria abatida e continuei chorando. Muitos que passavam se compadeciam de minha tristeza, mas não chegavam perto. Apenas uma senhora, vestida para ir a missa, com seu melhor traje de domingo, disse:
- Menina, menina, não sofras tanto. Eu também já chorei várias vezes aqui nessa mesa...De início chamava o Conselho Tutelar. Eles recolhiam todas as crianças da rua, davam lições de moral nas mães e no outro dia estavam todos de volta. Uma vez chamei aquele guarda que fica na esquina, sabe? A mãe dessa menina me ameaçou de tudo que é coisa...Acabei entendendo, com o tempo, que ela não pode fazer melhor, não tem recusros emocionais, cognitivos, estruturais para isso. Ela faz o que pode!
E foi saíndo, a senhorinha. Me deixou ali, sozinha. E as lágrimas voltaram a cair...


2 comentários:

Luísa disse...

É assim o mundo que temos. Crianças com olhilhos brilhantes de esperança que afinal não passa de uma fantasia. Morta antes de nascer. Adultos que fazem o melhor que podem, o que é pior que nada. Mas eles não sabem. A sua esperança também morreu antes de nascer.

Beijos
Luísa

Principe Encantado disse...

Amiga este é o mundo em que vivemos, a realidade cada vez mais próxima de nós, em cada esquina encontramos uma e enquanto perdurar essa politica mundial de hipócritas não poderemos erradicar esse mal da sociedade.
Abraços forte